Extra Digital

Princípio da insignificância

Em 29 de março, P. viu acabar o leite em pó que dava a seu filho de 2 meses. Após passar horas vendendo doces de banana num farol do Leblon, a mãe solo de 19 anos não juntou R$ 15 necessários para alimentar o bebê que chorava de fome. A jovem, que esconde o rosto ao ser fotografada, foi flagrada com seis peças de picanha que, vendidas, lhe garantiriam dinheiro para o alimento do filho.

— Foi um momento de desespero. Não sabia o que fazer, então peguei a carne para vender e comprar o leite — diz a jovem, presa por três dias.

Para não seguir na cadeia, ela fez um acordo de não persecução penal em troca do pagamento de R$ 500. Pouco para cobrir o preço da carne furtada, estimada em R$ 760, mas alto demais para sua precária situação de vida. Ao tomar conhecimento do caso, o advogado Joel Costa fez campanha virtual para ajudá-la.:

— Contra a fome não tem mandado de prisão. O objetivo da vaquinha foi tirar da P. o peso da injustiça que seria pagar R$ 500 ao Estado, sendo que ela não tinha condição de pagar a sua própria comida.

Se o Código Penal for levado ao pé da letra, qualquer furto pode dar até quatro anos de prisão. Há mais de uma década, porém, as cortes superiores consolidaram jurisprudência de que se deve extinguir processos que envolvem valores pequenos, sem violência e sem grande prejuízo para a vítima. É o chamado princípio da insignificância. O entendimento, que tem o objetivo de não sobrecarregar o Judiciário, nem sempre é seguido nas instâncias inferiores, que continuam processando e prendendo acusados.

— Por que se ocupar com casos de lesões inexpressivas, quando há casos de muita expressividade? — questiona Lucia Oliveira, da Defensoria Pública do Estado do Rio.

O PAÍS

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2021-10-24T07:00:00.0000000Z

2021-10-24T07:00:00.0000000Z

https://extra-globo.pressreader.com/article/281758452494155

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